Um estudo de controle é um em que se usa um grupo de controle para comparar com um grupo experimental num teste de uma hipótese causal.
Por exemplo, digamos que um amigo seu afirma que qualquer um pode criar a sua sorte e fazer coisas acontecerem usando apenas o poder da vontade. Ele diz-lhe que não existem coincidências e que cada um cria a sua realidade.
No inicio é repelido e atraido simultaneamente pelas noções do seu amigo. A ideia de ser capaz de fazer o mundo conformar-se aos seus desejos é muito atraente. Por outro lado, já vive neste mundo há tempo suficiente para saber que não é bem assim. A sua experiência parece contradizer as afirmações. Boa sorte e má sorte parecem cair indiscriminadamente sobre as pessoas. Coisas boas e coisas más acontecem de igual modo a pessoas boas e pessoas más. Mas sabe que as pessoas dizem que fulano tem "sorte", enquanto outros teem "azar". Talvez não seja o destino ou o acaso que fazem as pessoas sortudas ou azaradas.
A experiência tambem lhe diz que coincidências acontecem a toda a hora. Vai ao dicionário e vê que coincidencia é "uma sequencia de acontecimentos que embora acidentais parecem terem sido planeados ou combinados." Você pergunta: e se as coincidencias são realmente sequancias que embora pareçam acidentais são realmente planeados?
Finalmente, considera a afirmação de que uma pessoa pode controlar acontecimentos exteriores por um acto interno de vontade. Você sabe da experiencia que é falsa. Você tentou-a quando ouviu falar pela primeira vez em psicocinética. Tentou mover lápis com a mente, ganhar a lotaria desejando com força escolher os numeros que iam saindo. Tentou mesmo atrair raparigas implantando psiquicamente desejos na mente delas. Nada funcionou. Ouve falar de pessoas que se juntam para terminar guerras e fomes desejando-o, mas as guerras continuam e a fome no mundo continua.
Portanto, parte de si acha que o seu amigo está iludido. Contudo, outra parte diz-lhe que pode haver algo de verdade na história. Uma coisa a favor do seu amigo, pensa, é que ele não referiu forças divinas ou paranormais. Apenas falou do poder da mente. Isto pode ser testado, pensa.
Mas como testa isto? Primeiro, tem de clarificar as suas ideias para saber exactamente o que vai testar. Que noção vai testar?
"Uma pessoa pode criar a sua própria realidade."
"Uma pessoa pode fazer coisas acontecerem por um acto de vontade."
"Qualquer um pode criar a sua sorte."
"Não há coincidencias."
"Todos os acontecimentos resultam de um acto de vontade."
"Todos os acontecimentos são parte de um plano."
Para o ajudar a decidir que afirmação testar, tem de considerar o que o teste de controle deve atingir. Quer ser capaz de comparar dois grupos, um grupo de controle e um grupo de experimentação. Quer que o grupo experimental use técnicas de modo a atingir um efeito especifico, mesurável ou observável. Quer que o grupo de controle não seja diferente de nenhum modo do outro grupo excepto no facto de que não usarão qualquer técnica. Raciocina que se existir uma diferença significativa entre os grupos, isso se deverá a presença ou ausência da vontade da mente nos dois grupos.
O motivo porque quer fazer um estudo de controle é porque se só estuda aqueles que usam a vontade mental, não consegue eliminar outras causas possiveis para os efeitos que observar. O principio é melhor compreendido com outro exemplo. Digamos que tem borbulhas na cara e quer livrar-se delas. Há inumeros "remédios" nas prateleiras da sua farmácia. Um, chamemos-lhe ZitsRgone, promete livrá-lo das borbulhas em sete dias ou devolvem-lhe o dinheiro. Você compra-o, usa-o e as borbulhas desaparecem em sete dias. Foi o ZitsRgone a causa delas desaparecerem? Podiam ter desaparecido mesmo se não fizesse qualquer tratamento à sua pele. Para ter a certeza de que o ZitsRgone é efectivo, precisa de fazer um estudo de controle.
Digamos que tem seis borbulhas em cada lado da face. São similares, no tamanho, na crosta, etc. Usa o ZitsRgone num lado (o seu grupo experimental de borbulhas) e nada no outro lado (o grupo de controle). Se o ZitsRgone é um factor causal significativo para a erradicação das borbulhas, então deve notar diferenças significativas no fim da sua experiência. Se, após uma semana, ambos os lados parecem iguais, então é de afirmar que o ZitsRgone não é um factor causal significativo. Se, contudo, o lado do ZitsRgone está limpo enquanto o outro continua com borbulhas, podemos afirmar que o ZitsRgone funciona? Desafortunadamente, não. É possivel que tenha favorecido o lado do ZitsRgone e a sua percepção tenha sido afectada pelo seu desejo de que o produto funcione. Para testar devidamente a sua hipótese precisa de fazer um estudo cego.
Para eliminar a possibilidade de falha na percepção e avaliação, bem como no tratamento, tem de usar dois cremes, um que contem ZitsRgone, e outro que parece ZitsRgone e é aplicado do mesmo modo mas é realmente um placebo. Nós não lhe dizemos qual é o creme de ZitsRgone. Está a pôr creme X num lado da cara e creme Y no outro lado e não sabe qual é qual. Mais, não o deixamos avaliar o resultado. Pode ter pensado que o creme X é o ZitsRgone e a sua crença pode afectar a sua avaliação. Portanto, pedimos a vários observadores independentes para avaliarem a sua "borbulhice" antes e depois (qualidade e quantidade das borbulhas). Os avaliadores não sabem qual dos cremes, X ou Y, é o ZitsRgone, pelo que o seu julgamento não é influenciado pelas suas crenças ou conhecimentos. Após darem os resultados, revelamos finalmente qual dos cremes é o ZitsRgone.
Se o ZitsRgone é um factor causal significativo na redução das borbulhas, então os nossos resultados devem mostrar uma diferença significativa entre os dois lados, e que o lado tratado com ZitsRgone deve ter um sucesso significativamente superior ao lado de controle. Se assim é, podemos agora afirmar que o ZitsRgone funciona? Não, infelizmente a nossa amostra de estudo é demasiado pequena para podermos tirar conclusões significativas. Devemos fazer um estudo em larga escala para ter a certeza de que a diferença que encontramos não se deve ao acaso.
Agora, temos de reconhecer que temos um problema para testar uma hipótese como "nada acontece por acaso". Um grupo de controle assume que algumas coisas acontecem por acaso e outras não. Se fosse verdade que nada acontece por coincidência então não poderiamos testar qualquer afirmação causal.
Mas agora temos um problema. A nossa lista de afirmações a ser testada inclui uma que não só não pode ser testada como implica que nenhuma das outras o pode. Contudo, parece ser possivel testar prlo menos uma das afirmações, nomeadamente, a de que tudo acontece por força da vontade. Se é verdade que podemos testar esta afirmação, então será lógico concluir que a teoria defendida consiste de pelo menos uma afirmação falsa e é inerentemente contraditória. Geralmente, pessoas razoáveis não consideram afirmações falsas ou contraditórias.
Mas é realmente possivel testar se todos os acontecimentos são causados pela vontade? Bem, se é verdade que todos os acontecimentos são causados pela vontade, então é verdade que alguns acontecimentos o são. Podemos, pois, restringir-nos a um tipo particular de acontecimento e testar uma hipótese mais especifica que, se for verdadeira, confirma mas não prova, a nossa hipótese mais geral. Por exemplo, podemos testar a hipótese de que através de um acto de vontade uma pessoa pode provocar a morte de outra. O que podemos fazer é criar uma lista de 2.000 pessoas famosas entre 60 e 70 anos de idade, e alea´oriamente dividi-las em listas de 1.000 pessoas cada (Lista A e Lista B). Selecionamos ao acaso 2.000 pessoas para a nossa experiência e dividimo-las em dois grupos. A cada pessoa do Grupo A é dado um nome da Lista A e é treinada a querer a morte da pessoa cujo nome recebeu. A cada pessoa do Grupo B é dado um nome da Lista B, mas não se lhes diz mais. São aldrabados e é-lhes dito que estão numa lista de espera para um grande estudo sobre potencial humano.
Damos aos nossos participantes tempo bastante para conseguirem os seus actos de assassínio pela vontade. Após um ano, verificamos a Lista A e vemos quem morreu no decurso desse ano. Digamos que 100 pessoas morreram. Significa que a vontade só é efectiva nesta percentagem? Claro que não. Se realmente funcionasse, nenhuma das pessoas da lista estaria viva. Mesmo assim, 10% morreram. Isso não prova que pelo menos algumas pessoas conseguem usar a sua mente de um modo especial? Não. Lembrem-se da Lista B. Se cerca de 10% dos nomes dessa lista morreram, então isso indica que as mortes da Lista A não foram causadas pela força de vontade, mas coincidentes com a nossa experiência.
Agora, como podemos testar a hipótese de que as pessoas criam a sua sorte? Ou a afirmação de que todos os acontecimentos são parte de um plano? Esta ultima afirmação é certamente metafisica e impossivel de testar empiricamente. A primeira parece depender da crença metafisica de que nada acontece por coincidência, pelo que tambem não é testável.
O facto de uma afirmação não poder ser testada empiricamente não significa que seja falsa. Mas isso não significa que não seja empirica. E, no caso que temos falado, parece ser manifestamente o caso de que pôr a sua fé em tal crença faz-nos manter noções contraditórias e/ou abandonar a crença de que qualquer hipótese causal pode ser testada.
Links
Giere, Ronald, Understanding Scientific Reasoning, 2nd ed,(New York, Holt Rinehart, Winston: 1984.
Kourany, Janet A., Scientific Knowledge: Basic Issues in the Philosophy of Science, Belmont: Wadsworth Publishing Co., 1987.
Sagan, Carl. The Demon-Haunted World: Science as a Candle in the Dark, New York:Random House, 1995.